terça-feira, 12 de julho de 2011

Ouvir, a principal técnica do diálogo

Alkindar

Dizem que é preciso debater à exaustão determinado tema conflitante, para chegar-se a um consenso. Há nesta corriqueira afirmação um equívoco: num debate dificilmente chega-se a um consenso, pois o termo “debate” pressupõe a existência de perdedor e ganhador. Portanto, como regra, não há como chegar a um consenso num debate. No debate a pessoa chega com determinado pressuposto e procura vencer, com suas idéias, as opiniões dos outros participantes.

Se for preciso chegar a um consenso, o mais adequado instrumento da comunicação é o diálogo. O objetivo maior do diálogo é atingir resultados extraordinários, assim sendo, num primeiro momento o verdadeiro diálogo admite e valoriza a ausência do consenso, pois só assim irão aflorar diversas idéias e sugestões sobre o tema-foco, mas na hora da ação, isto é, no momento de agir, a presença do consenso é fundamental.

A diferença básica entre a debate e o diálogo é que, enquanto no primeiro caso a pessoa já chega com suas idéias prontas procurando impô-las, no segundo, a pessoa despe-se de suas verdades ou pressupostos. No diálogo o grupo está aberto e predisposto a explorar diversos pontos de vista para se chegar a um bom resultado. Não há, no diálogo, pessoas perdedoras e ganhadoras, mas, sim, idéias vencedoras.

Outra diferença básica entre o debate e o diálogo é que, enquanto no primeiro caso (debate) os integrantes se utilizam de reflexões com o objetivo de encontrar argumentos que destruam ou enfraqueçam as idéias do outro, no segundo caso (diálogo) as pessoas fazem reflexões sobre a validade de suas próprias idéias.

No livro A Quinta Disciplina, Editora Campus, seu autor Peter Senge relata algumas frases determinantes do David Bohm sobre diálogo. David Bohm, destacado estudioso da física quântica, em uma das suas frases traduz a essência do diálogo: “No diálogo não estamos tentando vencer. Todos estaremos vencendo se estivermos fazendo de maneira correta”.

Diz ainda David Bohm: “O propósito do diálogo é revelar as incoerências do nosso pensamento”. Em consonância com esta frase Peter Senge desenvolve a seguinte teoria: “Quando um conflito vem á tona em um diálogo, as pessoas provavelmente percebem que há uma tensão, mas a tensão surge, literalmente, dos nossos pensamentos. As pessoas dizem ‘São os nossos pensamentos e a forma pela qual nos atemos a eles que entram em conflito, não nós’. Assim que as pessoas vêem a natureza participativa de seu pensamento, elas começam a se separar de seu pensamento. Começam a assumir uma posição mais criativa e menos reativa a seu pensamento”.

Por estas considerações de Peter Senge e de David Bohm, deduz-se que nas vezes em que quisermos atingir a efetividade em nosso meio, o diálogo é a ferramenta mais adequada, e não o debate.

Sobre o diálogo no mundo corporativo ou institucional, continua Peter Senge no já citado livro A Quinta Disciplina:

“Bohm identifica três condições básicas necessárias ao diálogo:

Todos os participantes devem ‘suspender’ seus pressupostos, literalmente colocando-os ‘como se estivessem suspensos diante de nós’;

Todos os participantes devem encarar uns aos outros como colegas;

Deve haver um ‘facilitador’ que ‘mantenha o contexto’ do diálogo.

Essas condições contribuem para permitir o ‘livre fluxo de significado’ passando entre os membros do grupo, diminuindo a resistência ao fluxo”.

“Suspender os pressupostos”, de David Bohm, comenta Peter Senge: “Significa segurá-los ‘como seestivessem pendurados à sua frente, constantemente acessíveis ao questionamento e à observação’. Isso não significa que temos de jogar fora nossos pressupostos, suprimi-los ou evitar sua expressão. Tampouco, de maneira alguma, significa que ter opiniões é ‘ruim’ ou que devamos eliminar o subjetivismo. Ao contrário, significa estarmos conscientes dos nossos pressupostos e submetê-los a exame. Isso não pode ser feito se estivermos defendendo nossas opiniões. Tão pouco pode ser feito se não tivermos consciência dos nossos pressupostos, ou de que nossas visões baseiam em pressuposto, ao invés de fatos incontroversos. Bohm argumenta que uma vez que o indivíduo ‘se fecha numa posição’ e decide que ‘é assim que tem de ser’, o fluxo do diálogo fica bloqueado”.

Sabermos OUVIR, a principal técnica do diálogo.

Para – de fato - sabermos falar e ouvir, é preciso que nos desenvolvamos em relação à empatia, à alteridade e à assertividade, que são – no conjunto – o tripé que sustenta o diálogo.

Para aprendermos a ouvir temos que ter uma grande força de vontade, haja vista que a resistência à mudança faz parte da natureza humana. Vejamos a seguir alguns exemplos de como somos resistentes a aceitar o novo.

O ex-executivo, e hoje articulista e palestrante, Max Gehringer, relata em um dos seus artigos, que certa vez distribuiu aos seus funcionários um produto em cuja embalagem constava a informação “Novo Sabor”. Pediu que todos experimentassem o produto e dessem sua opinião. O resultado da pesquisa mostrou que 52% acharam ruim o novo sabor; 30% acharam-no regular e 18% gostaram do novo sabor. Então, ele reuniu o pessoal e, para surpresa de todos, disse que a única alteração feita foi na embalagem do produto (“Novo Sabor”), pois o sabor continuava o mesmo!

Caro leitor, veja como é possível resistirmos até a uma “aparente” mudança! Com essa experiência a intenção de Max Gehringer foi simplesmente mostrar ao seu pessoal como somos resistentes às mudanças. E conseguiu. Seu pessoal reagiu negativamente a algo que nem havia mudado! Mas muitas vezes nem mesmo provando uma nova descoberta, a resistência deixa de existir. Relembremos o caso Galileu.

Certa vez Galileu reuniu os principais professores da Universidade de Pizza à frente da torre homônima para provar, cientificamente, que dois objetos com pesos diferentes lançados de uma mesma altura e num mesmo momento, levariam o mesmo tempo para atingir o solo. Galileu conseguiu provar aos estupefatos professores que o peso do objeto não é preponderante. Isto é, que qualquer que fosse o peso de cada um dos objetos , eles chegariam juntos ao solo. Galileu provou tal fato. Sabe o que os professores continuaram lecionando? Continuaram por muitos anos ensinando aos seus alunos o contrário do que Galileu havia cientificamente provado.

Mas por que eles agiram assim de forma tão absurda? Porque, insisto, nós somos resistentes às idéias novas.

Uma das mais importantes leis da comunicação interpessoal, a Lei de Russel, diz que “A resistência a uma idéia nova aumenta na proporção do quadrado de sua importância”. A conscientização desta realidade evita muitos dissabores, pois em vez de criticarmos os outros por serem resistentes às nossas idéias, compreenderemos que esta é uma característica própria da natureza humana. Portanto, cabe-nos aplicar técnicas adequadas para vencermos as resistências dos outros às nossas idéias, que é um dos objetivos deste texto. Mas que não nos esqueçamos que nóstambém somos resistentes às idéias do outros.

Carl Rogers, psicólogo humanista, reforça nossa resistência às idéias novas: “Mesmo entre aqueles que aceitaram as regras fundamentais da ciência, a crença provisória nos resultados da investigação científica. apenas se dá quando existe uma preparação subjetiva para ela. Ressalta de tudo isto que a possibilidade de eu acreditar nas descobertas científicas dos outros ou nos meus próprios estudos, depende em parte da minha receptividade em relação a estas descobertas”. Deduz-se desta afirmação de Carl Rogers a importância da lição que Benjamin Franklin nos passa: “Se quiseres convencer, fale de interesses, em vez de apelares à razão”.

Os comentários acima de Max Gehringer, a história de Galileu, a Lei de Russel e Carl Rogers evidenciam como somos resistentes às idéias novas. Mas a questão é: qual é o melhor instrumento para vencer tanto a resistência do outro quanto a nossa às idéias novas? A resposta é uma só: aprendermos a ouvir.

O diálogo tem como principal regra o fato de sabermos, ou aprendermos, a ouvir o outro.

Sobre este assunto, faço a seguinte adaptação de um artigo que escrevi em tempos passados:Deming, o papa da Qualidade Total, disse que o melhor antídoto à criatividade, isto é, o que mais prejudica o aflorar da criatividade é o fato do funcionário sentir-se que faz parte de uma equipe assustada, sentir-se parte de uma equipe que tem medo de dar idéias ao líder, pois sabe que naturalmente serão rechaçadas. O bom líder deve saber trabalhar a natural resistência que temos às idéias e fatos novos. Antes de dizer “não vai dar certo” ou “já fizemos isto antes e não funcionou”, ouça. Ouça, ouça e ouça.

Incentive a pessoa a falar. Pergunte detalhes. Valorize a idéia do próximo. McKnight, o lendário ex-presidente da 3M, deixou-nos algumas lições: “Ouça qualquer pessoa que tenha uma idéia original, não importa quão absurda possa parecer à primeira vista. Motive, não fique preocupado com detalhes. Deixe que as pessoas desenvolvam uma idéia.”

Técnicas para bem ouvir.

Algumas boas dicas, passadas pela educadora Joanna de Angelis, para aprendermos a ser bons ouvintes:

a) Não interrompa o interlocutor passando informações várias, talvez desinteressantes para ele;

b) Não aparente saber tudo, estar por dentro de todos os acontecimentos;

c) Não lhe tome a palavra, fazendo a conclusão, em vez de deixá-lo concluir à sua maneira;

d) Seja gentil, fazendo com que sua cordialidade o deixe à vontade;

e) Deixe que sua cordialidade o ponha à vontade para descarregar tensão, sofrimento;

f) No momento próprio, fale com naturalidade, sem a falsa postura de intocável ou sem-problema;

g) Procure ressaltar da idéia ouvida algo de positivo, de interessante; agradeça-lhe a idéia. Se tiver que fazer críticas, utilize-se da docilidade e do bom senso.

A importância de perguntas adequadas para bem ouvir.

Para bem ouvir, nós temos que também saber bem perguntar. Veja logo a seguir duas formas de perguntar a um líder religioso se é permitido fumar e rezar ao mesmo tempo:

a) Posso fumar quando estou rezando?

b) Posso rezar quando estou fumando?

No exemplo, a probabilidade da resposta ser positiva está muito mais evidente na segunda pergunta. Não basta perguntar, é preciso saber “como” perguntar.

As perguntas que geram mais reflexão e iniciativa são: “O quê?” e “Como?”. Outras perguntas também importantes são: “Quem?”; “Onde?”; “Quando?”; “O que mais?”; “O que você quer?”; “O que isso vai te trazer?”; “Como você poderia fazer isso?”. Acrescente também a colocação: “Me diga mais...”. Para não parecer um interrogatório, as perguntas precisam ser entremeadas com simpática e produtiva conversa.

Aprendendo a ouvir em três níveis.

Precisamos aprender a ouvir em três níveis: Interno; Focado e Global. Interno, quando faz suas reflexões interiorizando o que concluiu da fala do outro, para só depois comentar; Focado, no sentido de associar o que ouviu ao propósito da reunião ou do diálogo; Global, no sentido de sempre ter uma visão generalista para que a flexibilidade se faça presente.

Aprendendo a ser bom ouvinte, passaremos a ter uma visão mais abrangente da realidade que está à nossa volta. O líder que muito fala e pouco ouve, mais expõe o seu universo e sua verdade do que aprende com o universo e a verdade das pessoas que estão à sua volta.

Reforçando o que foi dito mais acima, para – de fato - sabermos falar e ouvir, em outras palavras, para “sabermos dialogar” é preciso que nos desenvolvamos em relação à empatia, que é a habilidade de saber colocarmo-nos no lugar do outro; à alteridade, que é a arte de saber conviver com as diferentes pessoas; e à assertividade, que é a habilidade de comunicarmo-nos de forma transparente e verdadeira sem ferirmos o próximo. No conjunto, empatia, alteridade e assertividade representam o tripé que sustenta o diálogo.

http://www.alkindar.com.br/treinamento/cultura-do-dialogo.html

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